Denúncia: Jovem indígena brasileiro sofre xenofobia em Buenos Aires

Comunicador estava a caminho de Montevidéu para representar experiências brasileiras em congresso internacional.

No dia 9 de novembro, o educomunicador Walter Oliveira da Silva, 27 anos, saía de Santarém, no Pará, rumo a Montevidéu (UY), a mais de 4 mil quilômetros de distância. Sua missão era representar iniciativas brasileiras de comunicação comunitária, realizadas pela AIC e por parceiros (como o Projeto Saúde e Alegria, do Pará, do qual Walter faz parte) na FLACSO 2022, congresso científico que ocorre na capital uruguaia. A fim de ampliar as experiências do jovem indígena, foi comprada uma passagem de avião com destino a Buenos Aires, na Argentina, onde ele faria turismo antes de partir de barco para Montevidéu. Sua breve estadia na cidade, porém, foi marcada pelo tratamento xenófobo que recebeu no estabelecimento em que se hospedaria. 

Walter chegou à Argentina na noite do dia 11 de novembro, no Aeroporto Internacional de Buenos Aires, com suas reservas de hotel já em mãos. No entanto, houve um problema com o agendamento e foi necessário buscar uma nova acomodação para ele, ainda na mesma noite. Nossa equipe de suporte da viagem fez, então, nova reserva, via Booking, no Ideal Social Hostel, situado no centro da capital argentina. Ao chegar no estabelecimento, o jovem, que não fala espanhol, tentou se comunicar com os funcionários sobre a reserva e pediu que, enquanto os registros eram checados, ele pudesse carregar seu celular no hall do hostel. O aparelho era de extrema importância para o contato com o suporte de viagem no Brasil e já estava com a bateria drenada.  

De modo grosseiro, o funcionário disse que havia um problema com a reserva, não permitiu que o celular fosse carregado nem aceitou fazer contato direto, via WhatsApp, com a equipe de suporte de viagem. Enquanto Walter estava em ligação com a colega que tentava resolver o problema, o funcionário o agrediu verbalmente, aos gritos, e o expulsou do hostel, colocando o rapaz e suas malas na rua. Em paralelo, buscamos o atendimento ao consumidor do Booking, que tentou mediar a conversa e pedir que o hostel acolhesse o Walter, também sem sucesso.  

Já era noite e o rapaz não conhecia ninguém na cidade, então decidiu andar pelo centro de Buenos Aires, onde foi assaltado. Sem celular e sem poder se comunicar com sua equipe de suporte, pediu ajuda para regressar ao aeroporto da cidade, onde passou a noite. No dia seguinte, nossa equipe resolveu cancelar todas atividades turísticas na Argentina e antecipou sua viagem e estadia no Uruguai. 

A AIC vem a público denunciar e repudiar veementemente o ocorrido, para que casos como estes não se repitam. Sabemos que não se trata de um episódio isolado: a experiência de sujeitos periféricos fora de seus territórios de origem é, com frequência, acompanhada pela xenofobia e pelo racismo. É preciso afirmar o direito de pessoas como Walter, jovem indígena amazonense, circularem seus corpos e narrativas pelo Brasil e pelo mundo com liberdade e acolhimento.  

Toda nossa solidariedade a Walter! 

Viagem de divulgação científica 

Walter Oliveira é educomunicador do Projeto Saúde e Alegria (PSA), iniciativa que, desde 1985, combina educação, arte e comunicação, a fim de criar uma rede de mobilização social envolvendo os povos indígenas da Amazônia na defesa de suas vidas, cultura e tradições, totalmente conectadas à defesa da floresta. A atuação de Walter se dá, mais especificamente, na Rede Mocoronga, fomentada pelo projeto em Santarém (PA).  

Desde o final dos anos 1990, a Rede Mocoronga realiza e articula diversas atividades e produções comunicativas junto a dezenas de comunidades indígenas paraenses. Atualmente, a rede atua em 31 comunidades, com grupos de jovens articuladores em todas elas, e utiliza desde dispositivos mais artesanais, como os cartazes ou megafones, até produções multimídia para redes sociais. 

A viagem do jovem indígena ao Uruguai teve como objetivo divulgar junto à comunidade científica internacional essa e outras iniciativas voltadas à comunicação comunitária e cidadã no Brasil e narradas no livro Imagem Comunitária – como o projeto Puxando Conversa, que conta a memória popular do samba por meio do audiovisual, e o Inclusive Luísa, voltado à mobilização social pela inclusão de pessoas com deficiência. O Congresso Latino-Americano e do Caribe de Ciências Sociais, promovido pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), é um dos mais importantes eventos acadêmicos da América Latina no campo das humanidades. 

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