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Quando era criança, Dona Dalva de Oliveira acompanhava os mutirões que as famílias da Baixa, distrito de Uberaba, organizavam para a Folia de Santos Reis. A festa acontecia em fazendas com ranchos feitos de palha de Indaiá e mesa farta: os doces de frutas e leite começavam a ser preparados dias antes, e das fornalhas à lenha saía a comida para alimentar foliões e visitantes.
Memórias como essa, ligadas a manifestações do patrimônio cultural imaterial brasileiro, estão registradas no documentário Mineiridades, produzido pela AIC com recursos da Lei Federal de Incentivo à Cultura e patrocínio da VLI Logística. O média-metragem gira em torno de grupos culturais de oito cidades do interior de Minas Gerais e da região de fronteira do estado, percorrendo os sentidos e significados das manifestações para seus integrantes. A produção está disponível no site do projeto, junto às histórias de quem mantém vivas as tradições.
Em Sabará, Contagem, Divinópolis e Ibirité (MG), Mineiridades conta as histórias das Guardas de Marujos, Congo e Moçambique. Dançantes, Capitães, Reis e Rainhas revivem suas memórias e falam de sua ancestralidade e da devoção à Nossa Senhora do Rosário. As Folias de Reis são outro patrimônio imaterial de Minas Gerais abordado no documentário. Nas cidades de Campos Altos, Santa Luzia e Uberaba, as foliãs e os foliões percorrem ruas, casas e igrejas com suas companhias, representando os Santos Reis e saudando o nascimento do menino Jesus.
Por fim, o média-metragem chega à Três Rios (RJ), na fronteira com Minas. Lá, o Grêmio Musical Primeiro de Maio, fundado por ferroviários em 1910, mantém até hoje sua vocação para o ensino da música.
Ver a si na telona: o filme volta aos territórios
Entre os meses de maio e setembro, as oito cidades envolvidas na produção receberam exibições gratuitas do documentário. Em cada localidade, houve uma exibição aberta ao público, seguida de roda de conversa. Além disso, o projeto promoveu atividades junto a turmas escolares das redes públicas de ensino. Foram oportunidades para que os grupos culturais e a comunidade local se vissem, reconhecessem a si mesmos e a suas manifestações e valorizassem sua cultura. Foi também um momento em que puderam conhecer tradições de outros territórios, em suas similaridades e singularidades.
Uma série de acontecimentos marcou o giro do filme pelas cidades. São pequenos, mas significativos para dizer dos afetos que a produção provoca e da importância de registrar e difundir tradições afro-brasileiras e populares. Em Ibirité, o público reconhece as pessoas na telona; em Contagem, uma turma de Educação para Jovens e Adultos (EJA) estampa camisetas com estêncil, representando cenas e elementos do Congado; em Campos Altos, a emoção de familiares e amigos ao ver nas filmagens foliões queridos que já se foram.
Em Uberaba, Kalvin Kartier, aluno da rede municipal de ensino, assistiu ao documentário e compartilhou com a turma sua experiência no Congado, que frequenta junto com sua família. Para ele, Mineiridades traz um ensinamento necessário: “Acho o documentário muito importante, porque a tradição é uma cultura muito antiga, da época dos escravos… Muita gente não sabe disso ainda. E é isso que o filme está trazendo, para dar um aprendizado para as crianças, para quem não conhece, para quem quer aprender e para quem quer conhecer o que é um Congado! Eu aprendi muito também. Aquilo lá, pra mim, foi um ensinamento”.